terça-feira, 2 de dezembro de 2008

kitsunetsuki

Terca-feira, 28 de Agosto de 2007

Desvarios de Dario

Já que só falamos em raposas, o Professor Dario resolveu contar mais uma historia sobre elas. Há muito tempo, nos arredores de Curitiba, vivia uma família de raposas. Eram famosas pelo modo original de iludir as pessoas. Ninguém conseguia escapar de suas artimanhas.Uma delas transfigurava-se em barbeiro e deixava careca todos os clientes que o procuravam para fazer penteados ou aparar os cabelos. Assim, todos os homens da cidade ficaram de cabeças raspadas. Por isso, esta raposa mágica acabou ganhando o apelido de raposa barbeira.
Certo dia, na casa do Professor Dario (ele e’ matusalaico), uma reunião para esquentar as perucas. Afinal, era uma época em que os homens não precisavam mais se envergonhar em usar trancinhas com terere ou pintar o cabelo de lilás. Não era admissível que só em Lamenha Pequena não pudessem lambuzar o topete de gel. Apesar de estarem dispostos a fazer a raposa parar de brincar de raspadinha na cabeça de todo mundo ninguém sabia como. Então, descobriram, entre os homens da cidade, um que ainda tinha seus cachos. Era um jovem que vivia desenhando caricaturas, meio convencido, chamado Seto-san.
O Professor Dario , os poetas Emiliano Perneta e outros o chamaram para saber como havia se safado da ardilosa raposa barbeira.
Chegando ao local da reunião, Seto-san foi logo dizendo:

Uma libélula
tirando asas
uma pimenta vermelha.

Pimenta vermelha,
colocando asas,
uma libelula,
rebateu Emiliano Perneta.

Apesar de a arrogância irritar os presentes, ninguém viu outra alternativa senão pedir humildemente para que Seto-san desse um jeito na raposa.
O caricaturista pegou uma caneta e foi para o Praça Tiradentes, onde todos diziam que havia esconderijos de raposas. Quando caminhava por uma trilha entre pinheiros, cruzou com uma garota de olhar de mormaço.
- Você traiu o Bentinho!, foi logo acusando, apontando a caneta, desafiadora, para ela. – Eu...Konitchiwa, Seto-san. Está passeando na Praça Joaquim Jose da Silva Xavier ?
Seto-san desconfiou que era um truque ilusionista da raposa e sacudiu a caneta (tinteiro, naquela época) para jorrar tinta em seus olhos. A moça, assustada, esquivou-se do golpe deixando aparecer uma cauda branca.
– Raposa! Agora, você não vai escapar de meu golpe – disse, atacando a raposa com um ippon. A danada voltou a sua forma original e fugiu apavorada.
Vitorioso na primeira investida, ele ficou mais convencido de sua esperteza e foi caminhando pela praça.
Num banco viu uma mulher que parecia descansar. Desconfiou - outra raposa.
Assim que a mulher saiu andando, ele a seguiu, escondendo-se atrás das árvores enquanto a observava.Num momento a mulher agachou e juntou um punhado de capim seco. Dobrou os capins e, com eles, fez um boneco.
Seto-san segurou a respiração e observou atentamente.A mulher esticou os braços levantando o boneco e assoprou com força. Como num passe de magia, o boneco ganhou vida, transformando-se num bebê humano. Estupefato, Seto-san não tinha dúvida de que se tratava de uma raposa.
Com o bebê no colo, a mulher entrou na casa de um lenhador e foi recebida por uma velhinha com grande alegria.
A raposa está tentando enganar a pobre velhinha, pensou Seto-san. Preciso agir rápido. Pos o pezão na porta e a derrubou. Encostando a caneta no pescoço da mulher, disse:– Cuidado, minha senhora, esta raposa está tentando lhe enganar. Este bebê é um punhado de capim seco, vi com meus próprios olhos quando ela fez uma magia melhor que o Paulo Coelho – dizendo isso, apanhou uma corda e amarrou a mulher. A velhinha, que não estava entendendo nada, protestou:
– Senhor Louco, o que está fazendo com a minha nora, o senhor é um bonsaimaniaco ?
– Santa ignorância a sua, bat- chan! Ainda não caiu a ficha que esta é uma raposa astuta? Fox! Zorra ! Kitsune! Espie que vou provar.– Istopi total , senhor, está completamente enganado. Meu neto não é um punhado de palha, é uma criança de carne e osso.Além disto cometemos incongruências neste diálogo porque na juventude do Sr. Dario não se usava este linguajar.
– Minha senhora, estamos transcendendo as linguagens e os tempos neste conto que através da metáfora da raposa quer ressignificar conteúdos do inconsciente coletivo oriental e ocidental. Quer dizer, esta raposa se faz passar por gente e para quebrar o encanto, é preciso fazer fumaça com folha de cedro. Assim que a fumaça encobrir a raposa encantada, logo aparece um rabo branco e, depois, ela volta a sua forma raposina.
Seto-san arrastou a mulher amarrada para fora da casa, fez um monte de folhas de cedro e botou fogo para fazer fumaça.
A velhinha gritava desesperada para que Seto-san parasse com aquele ato bárbaro.– Pare com isso, o senhor vai matar a minha nora, a mãe de meu querido netinho.Sem se importar com as súplicas da velha senhora, Seto-san deixou a mulher coberta de
fumaças, o que a fez delirar, num ataque de tosse:
- Este velho penico é meu maior tesouro!, disse, correndo para pegar um penico esmaltado, herança de família.
– Não se preocupe, senhora, assim que quebrar o encanto, seu netinho vai voltar a ser um simples punhado de capim.
Por mais que a fumaça envolvesse a mulher, não aparecia nenhum rabo de raposa e ela continuava tossindo desesperadamente.
– Pare com isso, ela está morrendo, não está vendo o mal que está fazendo?Seto-san não parava. Estava convicto que aquela era uma raposa encantada. De repente, a mulher caiu e ficou esticada no chão.
– Minha nora morreu! Você matou a minha nora! Meu netinho vai ficar órfão! Quanta crueldade!Seto-san levou um susto. Balançou e desamarrou a mulher desesperadamente. Todas as tentativas para reanimá-la pareciam inúteis. Foi tomado de um grande arrependimento e, prostrado no chão, reconheceu seu engano.
– Matei essa pobre mulher por engano. Que erro terrível cometi! Não sou digno de continuar sendo um caricaturista.
Nesse exato instante, apareceu um monge no local.
– O que aconteceu por aqui? Parece uma tragédia.
Seto-san contou todo o seu infortúnio dizendo quanto estava pesaroso pelo imperdoável engano.– Sua alma jamais terá paz enquanto não purificar seu espírito.
A alma da pobre mulher, morta por engano, inconformada por tamanha injustiça, não terá paz. Vai se tornar, com certeza, uma alma penada. É necessário que reze muito, mas muito mesmo, por ela. Raspe sua cabeça e torne-se um monge, assim poderá dedicar muitas orações a sua pobre alma.
Seto-san desconfiou. Ai tem truta, mane. Mas fingiu concordar. Foi para trás de um barraco e meia hora depois apareceu de cabeça raspada. O monge tomou doril e sumiu num passe de mágica. Não só ele como a casa, o bebê, a velhinha e a mulher que parecia morta.Nisso, o povo da cidade encontrou Seto-san sentado sobre uma pedra com a cabeça raspada.– Vejam, a raposa barbeira conseguiu enganar Seto-san também!O caricaturista então tirou a meia de seda da cabeça e mostrou a farta cabelereira (mas já com alguns sinais de calvície ).
- Ah, não , foi o Seto quem enganou a Raposa!
E todos caíram na gargalhada, inclusive, incrivelmente, o sisudo Professor Dario.
Postado por Chyio Jô às 10 14 0 comentários

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